Capa da revista britânica The Economist: “Como formar um bom professor”
os próximos dez anos, metade dos professores brasileiros na ativa já terão idade para se aposentar. O dado consta de um estudo feito pelo Movimento Todos Pela Educação a partir de dados do Censo Escolar do Inep. O levantamento também revela que esse percentual vem crescendo nos últimos anos, tendo passado de 44% em 2007 para 49% em 2014. Isso significa que, em pouco tempo, as escolas brasileiras passarão por um significativo movimento de renovação de seu quadro docente, com a chegada de um número expressivo de novos professores.
Esta transição poderia ser menos preocupante caso os professores novatos ingressassem na carreira com uma sólida formação, que os preparasse adequadamente para os desafios que enfrentarão em sala de aula. No entanto, não é este o cenário retratado em estudos que analisaram os currículos de cursos de formação de professores no país (veja alguns deles na seção Para Saber Mais). A crítica mais comum é a de que os futuros docentes saem da universidade com uma formação didática insuficiente e com experiências também reduzidas de estágio supervisionado e vivência prática em contextos reais.No Brasil, um ingrediente que torna esta realidade ainda mais complexa é o fato de ser grande a probabilidade de um professor novato ser direcionado para atuar logo de início numa área de maior vulnerabilidade, sem que a escola ofereça a ele algum programa específico voltado para novos professores. Esta é uma realidade abaixo da média verificada em países desenvolvidos, como mostra um estudo internacional da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), feito a partir das respostas de diretores e professores de mais de 30 países.
No Estudo Internacional sobre Ensino e Aprendizagem (cuja sigla em inglês é Talis), o Brasil aparece como um dos países em que há menor proporção de diretores afirmando haver em sua escola algum programa específico de adaptação para professores novatos. Por aqui, apenas 23% dos gestores disseram existir alguma iniciativa com esse foco, ante uma média de 44% dos demais países da pesquisa.
A falta de programas específicos de acolhimento de professores novos na escola poderia ser amenizada caso esses profissionais começassem a trabalhar num ambiente de troca constante entre colegas. Infelizmente, este também não é um quadro comum no Brasil, quando comparado com outros países.
A mesma pesquisa da OCDE revela que 77% dos professores brasileiros afirmam que não têm o costume de observar o trabalho de outros colegas em sala de aula com o objetivo de dar ou receber algum retorno sobre seu trabalho. Na média dos países pesquisados, esta proporção cai para 45%.
Como era de se esperar em qualquer profissão, os dados da Organização mostram que a confiança dos professores em relação ao seu trabalho é menor no caso de profissionais em início de carreira. Ao descrever esse quadro, a OCDE (referindo-se não apenas ao Brasil) alerta que:
“a mistura de baixa confiança e do trabalho em escolas mais desafiadoras com a menor probabilidade de conseguir apoio de colegas mais experientes tende a aumentar a probabilidade de que novos professores abandonem a profissão”.
O tema da formação e apoio aos professores em atividade vêm ganhando relevância para além dos círculos educacionais. Em sua edição de 11 de junho de 2016, a prestigiosa revista britânica The Economist dedicou sua capa para o tema. Um dos diagnósticos da reportagem foi que, na maioria dos países ocidentais, professores trabalham de forma isolada, com pouco apoio dos demais colegas. Isso faz muitas vezes do magistério uma “profissão de muralhas”, como descreveu o professor inglês Anthony McNamara ao participar, em 2015, do Seminário “Caminhos para a qualidade da educação pública: Gestão Escolar”, organizado pelo Instituto Unibanco (sobre o tema, leia o boletim Aprendizagem em Foco n. 1).
Para derrubar essas muralhas, de modo que todos os professores, especialmente os novatos, recebam apoio constante, há várias ações que podem ser tomadas pelos gestores em diferentes esferas. Aos governos, cabe assegurar que os professores tenham o tempo necessário para trocar experiências com os colegas, um direito que é inclusive previsto na Lei do Piso Nacional do Magistério, que determina que um terço da jornada de trabalho seja destinado a atividades extraclasse, como planejamento pedagógico. Ações que reduzam a rotatividade do corpo docente e possibilitem a maior permanência diária do profissional numa mesma escola também são fundamentais para ajudar no estabelecimento de relações de confiança e para que essa cultura de troca aconteça.
Como sempre, os diretores também têm um papel essencial. Mesmo que não existam programas formais de apoio, um gestor pode contribuir muito para a recepção de um professor novato se der a ele especial atenção aos seus primeiros anos na função. Com base nos dados da pesquisa feita com professores e diretores, a OCDE recomenda que os diretores designem um docente mais experiente para atuar como mentor de um novato. Essa troca pode ser benéfica para ambos, pois um novo profissional pode também contribuir sugerindo inovações no ambiente escolar. O papel do mentor, portanto, é também o de um profissional disposto a escutar o colega e a construir uma relação de confiança e suporte.
Além de incentivar essa troca, o diretor pode ajudar também ao organizar uma grade de horários que permita que os mais novos tenham tempo para interagir com os mais experientes.
A busca por profissionais mais experientes e dispostos a contribuir para o início da carreira de um novato não precisa se restringir aos muros da escola. Se há em colégios vizinhos bons profissionais com mais disponibilidade para cumprir essa função, o diretor pode inclusive pedir ajuda de um colega em outro estabelecimento na busca desse profissional que possa atuar como mentor. Outra recomendação que a OCDE dá aos diretores de escola é ajudar professores a encontrarem programas de desenvolvimento profissional que possam contribuir com a melhoria da qualidade de suas aulas, sugestão válida não apenas para os novatos.
“Ao encorajar os professores a aprenderem entre si, diretores de escolas ajudam os professores a manterem seus métodos de ensino atualizados e podem contribuir para a criação de uma cultura colaborativa na escola.”
Recomendação da OCDE no relatório “A Teachers’ Guide to TALIS 2013”
Todas essas recomendações sobre a criação de uma cultura de colaboração são benéficas para todo o corpo docente. Ao trabalhar na construção de relações de confiança e suporte entre todos, o diretor ajuda a fazer das escolas um ambiente constante de aprimoramento profissional, sempre em buscas de melhores formas para melhorar a aprendizagem dos alunos.
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Aprendizagem em Foco é uma publicação quinzenal produzida pelo Instituto Unibanco. Tem como objetivo adensar as discussões sobre o contexto educacional brasileiro, a partir de pesquisas, estudos e experiências nacionais e internacionais.
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