e acordo com dados do Saeb-Prova Brasil 2015, coletados de escolas de Ensino Fundamental de todo o país, 97% dos diretores têm curso superior, a maioria em Pedagogia ou em licenciaturas de diferentes áreas, e 75% afirmam ter realizado alguma especialização.
Essa formação, no entanto, não os prepara para o exercício da função de gestor. De acordo com a pesquisa “Práticas Comuns à Gestão Escolar Eficaz”, de 2009, realizada pela Fundação Victor Civita com apoio do Ibope, embora a maioria dos diretores avalie bem sua graduação – 93% consideram que foi boa ou ótima –, 45% afirmam que a formação inicial não os preparou adequadamente para lidar com a realidade e o cotidiano da gestão escolar.
A insuficiência da formação inicial aumenta o peso da formação continuada. Segundo dados da Saeb-Prova Brasil 2015, 83% dos diretores declararam ter participado de alguma atividade de desenvolvimento profissional nos dois anos anteriores à pesquisa. Porém, 60% disseram que o impacto dessa formação foi de moderado a inexistente em sua atuação como diretor. Apenas 25% relataram que as formações que receberam durante o exercício da função tiveram grande impacto no seu dia a dia profissional.
O estudo “Práticas de Seleção e Capacitação de Diretores Escolares Adotadas por Secretarias Estaduais e Municipais de Educação” (2011), realizado pelo Cedhap a pedido da Fundação Victor Civita, ajuda a compreender as lacunas da formação continuada. Segundo os gestores ouvidos na pesquisa, os conteúdos dos cursos ainda são muito teóricos, não tratam de problemas concretos encontrados nas escolas e não ajudam a desenvolver as competências que os gestores escolares necessitam para exercer a função no dia a dia.
Diante da desconexão entre formação e prática, a troca de experiências entre diretores tem se mostrado uma estratégia bem-sucedida de aquisição de novos conhecimentos para o aprimoramento da gestão.
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), na publicação “What makes schools successful: resources, polices and practices” (2013) (“O que torna as escolas bem-sucedidas: recursos, políticas e práticas”, em português), destaca que “a constituição de redes de escolas ajuda a superar o isolamento das escolas e dos educadores ao oferecer oportunidades de troca profissional, de desenvolvimento e aprimoramento de forma estruturada”. A afirmação baseia-se na análise dos sistemas educacionais que têm se sobressaído no Pisa.
Um dos casos apresentados como exemplo é o de Xangai, na China, onde a colaboração entre escolas tem sido utilizada como mecanismo para promover a equidade na rede.
No Brasil, é possível citar o caso do Ceará – nacionalmente conhecido pelo salto dado pelo Estado nos indicadores referentes aos anos iniciais do Ensino Fundamental. Na análise das pesquisadoras Sofia Lerche e Eloísa Vidal, a criação de diferentes formas de colaboração entre as redes estadual e municipais e entre escolas constitui elemento central da política educacional cearense. No caso das escolas, essa cooperação foi induzida pelo governo estadual, por meio do Prêmio Escola Nota Dez. As escolas que se sobressaem na avaliação estadual são contempladas com recursos financeiros. Aquelas que apresentam os piores resultados também recebem um aporte extra de recursos e ambos os grupos devem “desenvolver, em parceria, pelo período de até dois anos, ações de cooperação técnico-pedagógica com o objetivo de manter ou melhorar os resultados de aprendizagem de seus alunos”.
A criação de comunidades de aprendizagem com foco na construção coletiva de conhecimento também vem sendo utilizada como uma estratégia formativa eficaz e que tem como uma de suas características o compartilhamento de experiências. A medida proporciona ao gestor – que muitas vezes atua de forma solitária na função – um espaço para falar sobre suas dúvidas e aprendizados e que possibilita que o grupo avance também coletivamente em termos de conhecimento.
“Ao criar uma comunidade em que há troca entre gestores, eles passam a ter pares para compartilhar. Conhecer uma diversidade de ideias, práticas, contextos, maneiras de lidar com os problemas é uma estratégia eficiente de formação em serviço”, explica o pesquisador Cesar Nunes, do Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Moral (Gepem) da Unicamp, que há duas décadas trabalha em projetos de criação de comunidades de aprendizagem junto a Secretarias de Educação.
Para que os grupos não percam o foco e a comunidade de fato avance, o pesquisador enfatiza que é fundamental que se sigam os princípios de construção coletiva do conhecimento, como buscar uma diversidade de ideias e incorporar o conhecimento produzido em estudos e pesquisas por especialistas.
Nunes destaca ainda que, dentre outros ganhos, as comunidades criam uma motivação intrínseca aos profissionais: “O gestor percebe que seus pares estão olhando para o que ele está fazendo e isso está contribuindo para melhorar a prática de outros. Esse é um dos efeitos mais importantes”.
A Leading Student Achievement (LSA): Networks for Learning, desenvolvida pelo Conselho de Gestores de Ontário, no Canadá, é um exemplo de comunidade de aprendizagem bem estruturada com foco na construção coletiva de conhecimento. O projeto baseia-se no desenvolvimento de uma rede de liderança que oferece apoio aos líderes distritais e escolares para melhorar a aprendizagem e o bem-estar dos alunos e a ferramenta principal é o compartilhamento de práticas bem-sucedidas. Essa rede busca formar comunidades de aprendizagem mais amplas, que incluam instituições da província, do país e até do exterior, justamente para ampliar as possibilidades de troca e o aumento de repertório.
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1. Melhoria de ideias
Toda ideia pode e deve ser melhorada. O processo de construção do conhecimento deve sempre partir de alguma provocação, desafio ou problema.
2. Problemas autênticos e ideias reais
Problemas de interesse do grupo, sobre os quais querem discutir e resolver, diferentes dos apresentados em livros, permitem esse processo de construção do conhecimento.
3. Diversidade de ideias
O processo de avanço do conhecimento depende da existência da diversidade. Para de fato entender e melhorar uma ideia é necessário conhecer todas as que a rodeiam, as semelhantes e as contrastantes.
4. Agenciamento epistêmico
São os próprios alunos que conduzem o processo de apresentar ideias, contrastá-las com ideias dos colegas, comentar, melhorar, verificar a validade e limitações, incorporar conhecimento de fontes confiáveis.
5. Avanço coletivo e conhecimento para a comunidade
As ideias e contribuições individuais são todas importantes e necessárias para que se chegue à ideia ou “teoria” do grupo, apresentada como a sua contribuição para o avanço do conhecimento.
6. Democratização do conhecimento
Os avanços no conhecimento representados pelas ideias e teorias finais não têm donos. Todos são responsáveis pela melhoria das ideias e igualmente valorizadas pelo resultado final.
7. Avanço simétrico do conhecimento
Esse processo de dar e receber ideias acontece dentro e fora do grupo. Os próprios alunos responsabilizam-se pelo avanço de todos.
8. Processo permanente de construção do conhecimento
Esse processo de melhoria de ideias para se chegar à construção do conhecimento passa a acontecer tanto dentro como fora da escola, não estando mais limitado a determinados momentos ou assuntos.
9. Uso construtivo de fontes reconhecidas
O processo de construção do conhecimento parte das ideias do grupo, mas para que de fato haja avanço é necessário incorporar de forma crítica e responsável aquilo que os especialistas sabem.
10. Discurso da construção do conhecimento
Construção do conhecimento depende de paradas para reflexão e avanço intencional.
11. Avaliação incorporada, concomitante e transformadora
Essa avaliação é responsabilidade também dos próprios alunos e acontece nos momentos de paradas para reflexão sobre a simetria das participações e avanço no conhecimento.
12. Construção em novos planos
A diversidade de ideias, experimentação, recombinação de ideias levam naturalmente a divergências, bagunça. É o processo de reorganização e síntese que permite lidar com essa complexidade.
Fonte: Elaborado a partir de síntese produzida pelo pesquisador Cesar Nunes sobre os princípios de construção coletiva do conhecimento, de Marlene Scardamalia e Carl Bereiter
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Elaine Hine, do Conselho de Gestores de Ontario, e Cesar Nunes, do Gepem/Unicamp são dois dos especialistas convidados do Seminário Internacional Caminhos para a qualidade da educação pública: Desenvolvimento Profissional de Gestores, nos dias 27 e 28 de setembro de 2017. O evento será realizado em São Paulo (SP) pelo Instituto Unibanco, Consed e Folha de S.Paulo.
Saiba mais em seminariogestaoescolar.org.br
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Aprendizagem em Foco é uma publicação quinzenal produzida pelo Instituto Unibanco.
Tem como objetivo adensar as discussões sobre o contexto educacional brasileiro, a partir de pesquisas, estudos e experiências nacionais e internacionais.
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