Nº 44 - nov.2018

GESTÃO

Estudantes esperam mais preparação para o mundo do trabalho

PARA SABER MAIS

qualificação para o mundo do trabalho é uma das finalidades da Educação Básica, prevista tanto na Constituição Federal como na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Por isso, também está presente nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e na Base Nacional Curricular Comum homologada em 2017 (ver quadro 1), que tratam não apenas das disciplinas necessárias para esse fim, mas também de habilidades cada vez mais exigidas no dia a dia profissional.

Estudantes de todo o Brasil também esperam que a escola os prepare para o mercado de trabalho. É o que mostra um levantamento realizado em 2016 pelo Porvir (site  de notícias  sobre educação que faz parte do Instituto Inspirare) em parceria com a Rede Conhecimento Social. Chamada “Nossa Escola em (Re)Construção”, a pesquisa ouviu 132 mil estudantes e ex-estudantes, de 13 a 21 anos, de todos os estados brasileiros, com o objetivo de identificar o que pensam da escola e como gostariam que ela fosse. Para a questão “Qual foco da escola os faria aprender mais? E ser mais felizes?”, 32% responderam que preparar para o mercado de trabalho os faria mais feliz – a taxa mais alta, ao lado de preparar para o vestibular e para o Enem, também com 32%; e 29% responderam que esse foco os faria aprender mais – a segunda resposta mais citada, atrás apenas de preparar para o vestibular e para o Enem, com 41% (ver gráfico 1).

É natural que jovens valorizem a preparação para o mundo do trabalho. Afinal, o exercício de uma atividade profissional é um dos principais meios para a conquista da tão desejada autonomia financeira, além da construção de uma vida social ativa e da realização de seus projetos de vida. Porém, a maior parte dos brasileiros não considera que a escola esteja cumprindo bem esse papel. Segundo a pesquisa Retratos da Sociedade Brasileira, realizada pelo Ibope Inteligência em 126 municípios a pedido da Confederação Nacional da Indústria em 2017, mais da metade dos brasileiros acredita que o(a) aluno(a) do Ensino Médio formado em escola pública está pouco preparado ou despreparado para o próximo nível de ensino ou para o mercado de trabalho (ver gráfico 2).

E o que o mundo do trabalho espera dos jovens?

De fato, atualmente, não basta apenas ter mais de 18 anos e diploma de Ensino Médio para que o(a) jovem decida sobre o seu futuro profissional, até mesmo com a expectativa ou garantia de uma graduação universitária. O relatório Future of Work and Skills, apresentado em 2017 pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), mostra que o mundo do trabalho está em rápida transformação. Segundo o documento, os avanços tecnológicos estão fazendo com que um número cada vez maior de atividades tradicionalmente realizadas por pessoas sejam automatizadas – e isso vale tanto para tarefas rotineiras quanto para funções mais elaboradas, em razão do surgimento da inteligência artificial, da internet das coisas e do aumento da capacidade computacional.

Com isso, além de exigir conhecimentos acadêmicos que a escola oferece, o mundo do trabalho passou a dar maior importância a habilidades mais difíceis de serem substituídas no processo de automação, como as ligadas ao pensamento crítico, à responsabilidade e ao comprometimento. São as chamadas competências socioemocionais, que englobam desde flexibilidade e empatia até capacidade de trabalhar em equipe, desenvolver atitudes de liderança, aprender continuamente e se comunicar com eficácia e clareza.

E nem sempre a escola consegue fazer com que o(a) estudante desenvolva bem essas habilidades. Com base em um levantamento realizado em 2010 entre quase 1.200 empresas da Argentina, do Brasil e do Chile, publicado no relatório Desconectados - Habilidades, Educación y Empleo en América Latina, de 2012, verifica-se que é mais comum encontrar nos jovens recém-formados no Ensino Médio as habilidades cognitivas técnicas adequadas do que as habilidades socioemocionais (ver gráfico 3). E quando há falta da primeira, as empresas encontram maior facilidade para resolverem essa carência com treinamentos específicos, o que já não é tão simples quando se trata das habilidades socioemocionais.

O mesmo raciocínio é ressaltado na publicação Introdução ao Mundo do Trabalho - Ensino Médio, desenvolvida pelo Instituto Unibanco em 2014 e utilizada como material de apoio ao Programa Ensino Integral do Estado de São Paulo. O documento informa que o mercado de trabalho costuma ser relativamente tolerante em relação à falta de conhecimentos técnicos do(a) jovem, que, em funções não especializadas, podem ser supridos por meio de treinamentos oferecidos pelo próprio empregador.

Informar para formar

Caberia então à escola incorporar essas outras habilidades em suas atividades curriculares e extracurriculares, de modo que o(a) jovem egresso(a) do Ensino Médio se veja mais apto(a) a lidar com os desafios que lhe aguardam no mundo profissional. E não são necessários muitos recursos ou grandes reformas para que isso ocorra. De acordo com o relatório Competências para o Progresso Social: o poder das competências socioemocionais, publicado pela OCDE em 2015, evidências sugerem que as competências socioemocionais podem ser ensinadas em matérias-padrão, como matemática e linguagem, por meio, por exemplo, da introdução de trabalhos que envolvam resoluções de problemas dinâmicos e interativos com base na vida real.

É o que também propõe o Programa Ensino Médio Inovador (ProEMI), instituído pelo MEC em 2009, cujo um de seus Campos de Integração Curriculares (CIC) é o “Mundo do Trabalho”. O documento orientador de 2016/2017 aponta para a necessidade de ações que contemplem a diversidade de questões que se inserem no exercício das diferentes profissões, de modo a se pensar o universo profissional “não só para o ‘mercado’, mas também para uma formação que contemple o trabalho coletivo, solidário, sustentável e autogestionário.

Algumas escolas já incluem atividades sobre projeto de vida e introdução ao mundo profissional com foco no desenvolvimento de competências. Um exemplo é a Escola Estadual Educador Pedro Cia, de Santo André, que faz parte do Programa Ensino Integral da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. A instituição trabalha questões como Projeto de Vida, Orientação de Estudos e Preparação Acadêmica e Mundo do Trabalho. Propostas semelhantes podem ser verificadas em escolas estaduais de educação profissional do Ceará, que também apresentam em sua matriz curricular disciplinas de Projeto de Vida e Mundo do Trabalho.

A professora Maria Ciavatta, doutora pela Universidade Federal Fluminense e coordenadora do Grupo THESE (Projetos Integrados de Pesquisa em Trabalho, História, Educação e Saúde), alerta, contudo, para a importância de que essa educação profissional não fique presa somente a atividades complementares. Para ela, a escola deve proporcionar ao(à) aluno(a) “uma formação sistemática, tanto nas atividades, quanto nos fundamentos das técnicas”.

Assim, seja por meio da introdução de novas disciplinas ou do aprimoramento das já existentes, a gestão educacional tem diante de si o desafio de inserir nas práticas pedagógicas a questão do mundo do trabalho em suas mais diversas perspectivas, de modo a ampliar as oportunidades de desenvolvimento pessoal e profissional dos(as) estudantes do país

>> É preciso ampliar o currículo do Ensino Médio para inserção no mundo do trabalho

1

>> Habilidades socioemocionais são essenciais para o cenário atual e futuro do profissional

2

>> As novas competências podem ser desenvolvidas em disciplinas regulares e atividades extracurriculares

3

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Aprendizagem em Foco é uma publicação quinzenal produzida pelo Instituto Unibanco.

Tem como objetivo adensar as discussões sobre o contexto educacional brasileiro, a partir de pesquisas, estudos e experiências nacionais e internacionais.

 

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