“[Na Secretaria e nas escolas] Todos discutem, justificam, desconstroem alguns mitos através dos resultados”

Julio Cesar Alexandre, secretário de Educação de Sobral (CE)

Utilizar avaliações externas como uma ferramenta para subsidiar tomadas de decisões no âmbito dos sistemas educacionais ou em cada escola é uma prática que estudos demonstram estar associada a redes e escolas com melhores resultados de aprendizagem

Júlio Cesar da Costa Alexandre no Seminário Internacional de Gestão Escolar

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PARA SABER MAIS

consolidação de uma cultura das avaliações externas, concebidas com o objetivo de aferir a qualidade do ensino, é uma das principais conquistas da área educacional dos últimos 20 anos. A implantação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) pelo governo federal nos anos 1990 deu início a um processo de disseminação das avaliações externas entre as redes de ensino, que se intensificou na década seguinte. Além de permitir verificar o cumprimento do direito à aprendizagem, as avaliações externas possibilitam às secretarias e escolas traçar um diagnóstico de suas redes e desenvolver estratégias para o enfrentamento dos problemas que estejam afetando o desempenho dos estudantes.

A disseminação das avaliações de larga escala veio também acompanhada de críticas a alguns de seus usos tanto no Brasil como no exterior. Em maio de 2014, mais de 80 pesquisadores de diferentes países divulgaram uma carta na qual manifestaram sua preocupação com o impacto do PISA (exame internacional da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE) nas redes de ensino, como, por exemplo, a ênfase gerada pelo exame apenas em aspectos mensuráveis, “estreitando, assim, perigosamente nossa imaginação coletiva sobre o que a educação é e deva ser”.

No Brasil, parte das críticas vai na mesma linha, apontando as limitações dos indicadores à mensuração do que se entende por qualidade do ensino. O Ideb é calculado a partir dos índices de fluxo e de proficiência dos alunos em Língua Portuguesa e Matemática. Não avalia, portanto, outras disciplinas que fazem parte do currículo, nem outras dimensões, que são também essenciais na preparação dos jovens para a vida adulta. Em defesa das avaliações, pode-se argumentar que elas se concentram na aferição de duas competências básicas aos alunos e essenciais para o seu desempenho escolar: leitura e resolução de problemas. Por outro lado, a inclusão da área de Ciências da Natureza nas avaliações será muito bem-vinda e deve estar entre os próximos passos a serem dados.

Um outro ponto de controvérsia relaciona-se aos usos que são feitos dos dados gerados pelas avaliações (especialmente como insumo para políticas de alocação de recursos nas redes de ensino e para elaboração de rankings). Vale ressaltar que elas não constituem um fim em si mesmas; não devem estar exclusivamente a serviço de ranqueamentos e menos ainda ter como efeito perverso reduzir a atuação da escola a treinar alunos para testes. Nesse sentido, é preciso que os gestores estejam atentos para os diversos usos positivos que podem ser dados às avaliações externas.

A principal função das avaliações é orientar as políticas educacionais, incidindo na rede como um todo, mas também subsidiando a gestão das escolas e impactando até mesmo as práticas em sala de aula.

Avaliações como instrumento de gestão

Utilizar avaliações externas como uma ferramenta para subsidiar tomadas de decisões no âmbito dos sistemas educacionais ou em cada escola é uma prática que estudos demonstram estar associada a redes e escolas com melhores resultados de aprendizagem. Um deles foi divulgado em dezembro de 2015 pelo Sesi-RJ. A pesquisa “O impacto da liderança dos diretores sobre os resultados dos alunos das escolas de ensino médio do estado do Rio de Janeiro”, por exemplo, realizada pela Universidade de Nottingham em parceria com a Universidade Federal Fluminense, concluiu que diretores de escolas bem-sucedidas costumam incentivar toda a equipe a utilizar os dados da avaliação externa no planejamento e gerenciam e discutem os dados das avaliações internas e externas com os professores.

Outra pesquisa que investigou o contexto brasileiro foi realizada em 2015 pela Fundação Lemann, Itaú BBA e Instituto Credit Suisse Hedging-Griffo. Foram investigadas em profundidade escolas públicas que vêm alcançando bons resultados nos anos finais do Ensino Fundamental e identificadas sete práticas recorrentes entre elas. O relatório destaca que “todas as seis escolas realizam, além da Prova Brasil, avaliações externas estaduais e/ou municipais, que têm periodicidade mais frequente e uma devolutiva dos resultados muito mais ágil”, subsidiando “revisão de planejamentos de aulas, aspectos metodológicos e avaliações internas.

Outro argumento em favor do uso de avaliações externas como ferramentas pedagógicas é que os próprios professores reconhecem o potencial desses instrumentos, mas dizem não saber como utilizá-los bem. Essa constatação aparece na pesquisa Conselho de Classe (2015), conduzida pela Fundação Lemann, que ouviu professores de todo o Brasil. Segundo o levantamento, 80% dos entrevistados concordaram com a afirmação de que a oferta de formação específica para que os professores possam orientar seu trabalho a partir dos resultados das avaliações externas contribuiria com a qualidade da educação pública.

Ciente dessa demanda, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) lançou em agosto de 2015 a Plataforma Devolutivas Pedagógicas. Por meio desse Portal, os professores e gestores podem visualizar a distribuição dos alunos da escola pelos níveis de proficiência e comparar os resultados da sua escola com outras escolas semelhantes da região. Também é possível acessar itens da Prova Brasil/Saeb acompanhados de comentários pedagógicos e de estatísticas de como os alunos responderam e, dessa forma, reorientar o trabalho feito
em sala de aula.

 

Avaliar é preciso

Sob a perspectiva da garantia do direito à educação, a implantação da cultura das avaliações nas redes públicas de ensino deve ser celebrada. As avaliações externas não só permitem aos gestores e às famílias acompanhar o desempenho dos estudantes, como também traçar diagnósticos da rede e identificar desigualdades existentes entre as escolas ou mesmo dentro de uma mesma escola. O uso gerencial das avaliações é de extrema relevância para uma gestão comprometida com a qualidade e a equidade da educação – como revela o caso de Sobral – e é fundamental que essa prática, ainda incomum, seja disseminada nas redes.

Ainda assim, é preciso considerar as críticas feitas a essas avaliações, para que elas sejam cada vez mais aprimoradas. Embora ainda tenham muito a avançar, elas cumprem, porém, um papel fundamental para política educacional: verificar se o direito à aprendizagem está sendo garantido. Como afirmou o ex-presidente do Inep Francisco Soares em entrevista no ano de 2012 aos Cadernos Cenpec:

“Num país diverso e desigual como Brasil, precisamos dar consequência ao direito constitucional à educação, registrar o aprendizado dos alunos de uma maneira uniforme. Isso só pode ser obtido com a medida. Um direito social que não é verificado é uma utopia”.

O caso de Sobral

A cultura de utilização de resultados de avaliações para orientar práticas de sala de aula pode ser induzida pelos sistemas de ensino. Foi o que aconteceu no município de Sobral (CE), cujo salto na qualidade do ensino público, especialmente nos anos iniciais, já foi reconhecido como referência nacional.

“Tanto a secretaria como a escola se debruçam sobre esses resultados, fazem suas análises e tiram suas conclusões. Esse é um grande momento na secretaria e dentro das escolas. Todos discutem, justificam, desconstroem alguns mitos através dos resultados”, explicou o secretário de Educação de Sobral, Julio Cesar Alexandre, durante seminário de gestão escolar realizado pelo Instituto Unibanco em setembro de 2015. “A avaliação externa é fundamental para esse processo (...). Os professores dão a sua contribuição, e os saberes que eles constroem são saberes escolares que retroalimentam o sistema”, complementou.

GESTÃO

Como utilizar

as avaliações externas para melhorar a aprendizagem

 

Nº 8 - abr.2016

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Aprendizagem em Foco é uma publicação quinzenal produzida pelo Instituto Unibanco. Tem como objetivo adensar as discussões sobre o contexto educacional brasileiro, a partir de pesquisas, estudos e experiências nacionais e internacionais.

 

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