Tanto funcionários quanto os professores, dos mais novatos aos mais experientes, precisam estar abertos a ouvir as famílias
Quando os pais ou responsáveis tomam a iniciativa de procurar a escola, esta nem sempre se mostra preparada para acolhê-los. E o inverso também ocorre: diretores que tentam atrair as famílias, mas não conseguem
uanto mais as famílias se envolvem com a educação dos filhos e participam ativamente da vida escolar, melhores são os resultados de aprendizagem dos alunos. Esta afirmação é praticamente consensual no campo educacional, e não faltam evidências para embasá-la. A maior participação dos pais resulta em melhores notas, como demonstra relatório divulgado em fevereiro de 2016 pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a partir de resultados do Pisa (exame internacional da entidade). Tem também impactos positivos na melhoria do clima escolar e redução da indisciplina (sobre o assunto, veja a edição número 4 do Boletim Aprendizagem em Foco).
Uma revisão de estudos sobre o tema divulgada em 2002 nos Estados Unidos sob encomenda do Centro Nacional para Conexão entre Família, Comunidades e Escolas mostrou também que os impactos são positivos independentemente da origem social dos estudantes. Ou seja, qualquer família tem muito a contribuir. Diante de tantas evidências, não resta dúvida da importância de engajar mais a família no cotidiano escolar. O desafio é como fazer isso.
As respostas dos alunos que participaram da Prova Brasil e do Saeb, exames do MEC que avaliam o aprendizado, indicam que esse desafio aumenta também conforme a etapa de ensino. Do 9º ano do Ensino Fundamental para o 3º ano do Ensino Médio, diminui a proporção de pais ou responsáveis que vão com frequência a reuniões na escola. Os números refletem a complexidade do Ensino Médio, etapa em que os alunos matriculados vivem um momento de transição em suas vidas, em que desejam ter maior independência e autonomia, mas, ao mesmo tempo, continuam precisando da confiança e orientação dos pais e de outros adultos. A despeito disso, existe um certo senso comum de que, à medida que os alunos crescem e avançam no percurso escolar, precisam de menos acompanhamento e suporte da família.
Para que a participação da família se torne realmente positiva e significativa na escola, é necessário antes de tudo uma mudança de atitude por parte de todos. É comum pais acharem que cabe à escola tomar a iniciativa de procurá-los, enquanto a escola, por sua vez, coloca toda a responsabilidade sobre os pais. Em muitas delas, famílias só são chamadas para falar sobre os filhos quando ocorre algum problema. Quando os pais ou responsáveis tomam a iniciativa de procurar a escola, esta nem sempre se mostra preparada para acolhê-los. E o inverso também ocorre: diretores que tentam atrair as famílias, mas não conseguem. O desafio é romper essa inércia e criar uma agenda positiva, que busque estratégias de aproximação em todos os momentos. Esse deve ser um compromisso tanto dos gestores e formuladores de políticas públicas quanto de diretores, professores, funcionários e pais ou responsáveis no cotidiano.
Em artigo publicado em fevereiro de 2016 no site do Harvard Family Research Project (Centro de Pesquisas sobre Famílias de Harvard), a pesquisadora Elena Lopez defende que é preciso, antes de tudo, gerar empatia entre pais e os atores da escola: “Uma abordagem centrada no ser humano começa com empatia, que é a capacidade de se colocar no lugar do outro e imaginar o que aquela pessoa sente e vivencia. Desenvolver essa atitude é uma maneira de trocar um modelo baseado apenas no que os educadores pensam que as famílias querem e precisam por uma abordagem que considere aquilo que as famílias efetivamente desejam e valorizam”.
Para que isso ocorra, é necessário criar nas escolas uma cultura de diálogo com os pais ou responsáveis. O diretor tem papel central nessa tarefa, mas ela não cabe apenas a ele. Tanto funcionários quanto os professores, dos mais novatos aos mais experientes, precisam estar abertos a ouvir as famílias. Estas, por sua vez, necessitam também entender o esforço que a equipe da escola realiza para o desenvolvimento de seus filhos. Todos precisam ser instados a sair de suas zonas de conforto em busca de um entendimento sobre o que é melhor para os estudantes.
Há farta evidência dos impactos positivos em todas as dimensões do fortalecimento da parceria entre escolas e famílias. Não há, porém, uma receita única de sucesso. A experiência de algumas redes ou escolas pode, porém, servir de inspiração. E é possível também identificar algumas características gerais em comum nas escolas bem-sucedidas nesse aspecto.
Uma atitude concreta para fortalecer esse diálogo pode ser a designação de um profissional da escola para ser o responsável pelo relacionamento com os pais e a comunidade. Esse modelo foi implementado em Nova York, e no Brasil inspirou o programa Coordenador de Pais, da Fundação Itaú Social. Entre as ações que podem ser atribuídas a este profissional estão: desenvolvimento de práticas que contribuam ativamente para intensificar a participação das famílias em reuniões; atendimento de pais ou responsáveis que procuram a escola com dúvidas; visitas domiciliares para agir preventivamente no caso de alunos com maior risco de evasão; estímulo ao trabalho voluntário de pais e alunos; e apoio à gestão da escola na busca de parcerias externas.
Outro exemplo de ação interessante nesse sentido e já desenvolvida por algumas escolas é a criação de grupos de formação para pais em temas relacionados à escola, aos estudantes e mesmo a conteúdos do currículo, permitindo que os pais possam apoiar e orientar melhor os filhos.
A experiência internacional e no Brasil mostra que, para que esse trabalho seja mais efetivo, é fundamental o apoio das secretarias de governo para facilitar a articulação entre diferentes áreas. Muitas vezes, no atendimento a uma família, pode ser verificada uma necessidade de conectar aquele aluno ou responsável a outros serviços públicos fora do âmbito da educação.
A responsabilidade de agir proativamente para criar pontes com as famílias e comunidades não deve ficar somente sob os ombros da escola. Mas isso não significa que nada possa ser feito enquanto as condições ideais não estejam presentes. Há muitas ações que podem e devem ser estimuladas a partir do papel de liderança do diretor.
Foi o que fez, por exemplo, Ricardo Paterlini, diretor da escola Coronel Gomes de Oliveira, em Anchieta (ES), que atende alunos do segundo ciclo do Fundamental e do Ensino Médio. Ele conta que, ao assumir a escola, ouvia constantes queixas dos professores de que os alunos não se interessavam pelos estudos, e que os pais também nunca apareciam na escola. Para mudar esse quadro, ampliou os meios de comunicação entre escola e pais, fazendo uso de ferramentas simples. Ele pesquisou nos dados de matrículas todos os números de telefones celulares dos pais, e criou grupos no WhatsApp de cada turma. Passou também a enviar mensagens de textos informando sobre os horários das reuniões. E criou ainda um perfil no Facebook para estimular esse contato. Por esses novos canais ou pelos tradicionais, os pais receberam o regimento da escola, e foram escolhidos líderes e vice-líderes em cada turma para ajudarem a facilitar esse diálogo.
“No início foi difícil. Mas, da última vez (em que foi convocada uma reunião) recebi 383 obrigados, alguns de pais que nem sabiam que existia essa reunião”
Ricardo Paterlini, diretor da escola Coronel Gomes de Oliveira
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Aprendizagem em Foco é uma publicação quinzenal produzida pelo Instituto Unibanco. Tem como objetivo adensar as discussões sobre o contexto educacional brasileiro, a partir de pesquisas, estudos e experiências nacionais e internacionais.
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