PARA SABER MAIS

studos, reportagens ou políticas públicas que abordam a gestão escolar têm, em geral, foco nos diretores, coordenadores e demais atores envolvidos nesse processo dentro da escola. Há, porém, um profissional que é também essencial para garantir o apoio e alinhamento das ações com as secretarias de educação: o supervisor. A nomenclatura deste cargo varia bastante entre Estados: inspetores, superintendentes, supervisores, tutores... Mas, em geral, trata-se de um servidor que, entre outras funções, é fundamental no papel de intermediação entre as escolas e as secretarias de educação e regionais de ensino.

Ainda que alguns dos nomes utilizados em estados remetam à ideia de um fiscalizador (alguém que supervisiona ou inspeciona), no Brasil e no mundo, têm se enfatizado a necessidade de pensar nesse profissional como alguém que seja, principalmente, um elemento de suporte às ações pedagógicas da escola.

Na série de quatro reportagens especiais deste Boletim Aprendizagem em Foco sobre os Estados líderes no Ideb do ensino médio (Goiás, Espírito Santo, Pernambuco e Ceará), um dos elementos em comum nas políticas dessas unidades da federação – três delas parceiras do Instituto Unibanco no programa Jovem de Futuro – foi justamente a mudança no perfil do supervisor. Gestores ouvidos na série contam que um dos desafios enfrentados foi a mudança no perfil e na cultura desses profissionais. Para que deixassem de serem vistos como mero fiscalizadores, houve esforço para que todo o sistema entendesse o papel deles como de assessoramento e apoio aos gestores.

Escuta ativa

Albert Einstein Freitas é diretor da Escola Estadual de Educação Profissional Avelino Magalhães, em Tabuleiro do Norte (CE). Com 18 anos de experiência na função, ele testemunhou essa mudança de perfil no Ceará. “Há 11 anos, quando surgiu esse profissional aqui na rede, as visitas eram mais para saber como estava a escola, para checar se as políticas estavam sendo implementadas. Era como uma prestação de contas. Achava a relação um pouco distante.  Com o passar do tempo, passamos a receber muito mais apoio. Hoje, é um profissional que chega para ajudar na questão pedagógica, para melhorar a relação com famílias, alunos e professores. Avançou muito”, relata Freitas.

Desde que assumiu a gestão da Avelino Magalhães, Freitas já passou por sete superintendentes, nome dado aos supervisores no Ceará. As experiências mais negativas que ele conta ter tido neste período era quando o profissional chegava já com uma lista fechada de temas a serem tratados, com o intuito de checar se tudo estava sendo realizado. Das experiências mais positivas, destaca a postura de supervisores que procuraram conhecer melhor a realidade local. “Acho positivo quando o superintendente procura se inteirar de cada detalhe, do perfil dos nossos alunos, de conhecer a realidade deles. Tem que chegar com esta abertura, com empatia. Por isso é importante ter um perfil de supervisor que tenha uma visão pedagógica e que entenda do chão da escola”, diz o diretor.

No caso da escola de Freitas, o profissional que atua na função é Paulo Bessa, há dois anos no cargo, responsável pelo apoio a cinco unidades de ensino na região do Baixo Jaguaribe. Para ele, é possível conciliar as demandas que vêm da secretaria ou das regionais com o atendimento diferenciado: “Mesmo que a gente tenha uma agenda em comum que venha da secretaria, é preciso um olhar diferenciado quando chegamos à escola. São realidades, pessoas, ritmos diferentes. A agenda precisa ser customizada, sabendo que haverá algumas em que precisaremos dedicar mais tempo e atenção, pois nem todas estão no mesmo ponto de partida.”

Bessa destaca ainda a importância de as visitas gerarem um encaminhamento, com ações a serem realizadas pelos gestores e pela secretaria para resolver os desafios detectados. “O importante é construir parcerias que caminhem para um objetivo comum”.

Para isso, é fundamental construir relações de confiança. “É preciso exercitar uma escuta ativa, sem imposição, trabalhando em cima de evidências, para que a escola passe a nos ver como parte integrante dela, como um parceiro. A gente quer também que os alunos aprendam. Há momentos em que é preciso chamar a atenção para o foco na aprendizagem. O importante é manter altas expectativas e construir parcerias. Se percebo que o núcleo gestor está muito enfraquecido, chamo professores, alunos e pais para ampliar os olhares, e ter mais pessoas motivadas e envolvidas no processo”, afirma.

Empatia

No Espírito Santo, esse profissional é chamado de supervisor escolar. Marcella Simonetti Pasolini é responsável pelo acompanhamento de três escolas, na região de Colatina. Ela também afirma que o passo mais fundamental é construir uma relação de confiança. “Um supervisor precisa ter essa habilidade de saber escutar, de ter um olhar sensível quando chega à escola. Precisa ter empatia, entender o outro a partir da perspectiva dele. O olhar não deve ser o de acusação, mas de acolhimento. Somos profissionais da educação. Ocupamos cargos diferentes, mas lutamos pelo mesmo objetivo, que é a melhoria da qualidade da educação pública”.

Outra característica que Pasolini entende como fundamental é o conhecimento técnico. “Nosso foco é a aprendizagem. Para que esse diálogo seja produtivo, é necessário ter conhecimento técnico e teórico para contribuir com os gestores escolares. Conhecer pesquisas, entender sobre gestão, sobre a escola, sobre seus territórios. Com isso e com essa atitude de escuta aberta, você entende o que a escola precisa de você. Nenhum trabalho de educação se constrói a partir do senso comum”.

PesquisaS

A atenção ao papel do supervisor escolar é uma das dez recomendações para as redes de ensino que constam do estudo Práticas Comuns dos Diretores Eficazes, encomendado pela Fundação Victor Civita e coordenado pelo pesquisador Fernando Abrucio (FGV-SP), baseado numa investigação feita em dez escolas de quatro municípios paulistas. Uma das conclusões da pesquisa é que a maior proximidade das secretarias com as escolas era um dos pontos-chave para explicar o bom desempenho. No caso de redes de grande porte, o supervisor é figura ainda mais estratégica para garantir essa proximidade e para a implantação e continuidade de políticas públicas com foco na aprendizagem dos alunos. Por isso, para exercer essa função, esse profissional precisa ter conhecimento para prestar assessoria pedagógica e de gestão às escolas, não podendo, segundo o estudo, ser confundido como um mero fiscal.

Coerência nas ações de todas as instâncias e a corresponsabilização em busca da melhoria da aprendizagem dos alunos são dois conceitos fundamentais nas parcerias do Instituto Unibanco com redes estaduais. Ter um supervisor bem formado, capaz de estabelecer relações de confiança, de alinhar com os gestores escolares os objetivos em comum, e de garantir apoio para que as metas sejam alcançadas são características que facilitam algo essencial em qualquer sistema funcional: a coerência de suas ações. É fundamental também que todos os atores trabalhem com o princípio da corresponsabilização, ou seja, em vez de apenas cobrar ou culpar as escolas por seus resultados, gestores em todas as instâncias trabalham para dar suporte visando um objetivo comum.

Como afirma o pesquisador canadense Michael Fullan, um dos maiores especialistas em gestão escolar no mundo:

Edimara Gireli Galon, diretora da escola David Hold, em São Roque do Canaã, é uma das gestoras apoiadas por Pasolini. Ela assumiu o cargo há apenas três meses, mas, como fazia parte da equipe gestora da escola, já convivia com as supervisoras. “Me formei em pedagogia e tenho uma pós-graduação em gestão. A gente às vezes acha que vai aprender tudo o que precisa, mas esse aprendizado acontece muito na prática. Hoje sou a profissional que sou graças também ao apoio de minhas supervisoras. Nunca as vi como pessoas que vinham me fiscalizar, mas como profissionais que me ajudavam a ter um norte”, diz.

  • As lições dos quatro Estados líderes do Ideb, Boletim Aprendizagem em Foco número 49 – Instituto Unibanco (2018). bit.ly/2ZKsOkj
  • Dez ações para a rede, Reportagem da revista Nova Escola (2009). bit.ly/30G5LHb
  • Práticas Comuns dos Diretores Eficazes, Fundação Victor Civita (2009). bit.ly/2EFuj9z
  • “The principal: three keys to maximizing impact” (O diretor: três chaves para maximizar o impacto), Michael Fullan (2014), sem tradução para o português

GESTÃO

Supervisores são fundamentais no apoio à escola

>> Estados líderes do Ideb apontam mudança no perfil como essencial para o sucesso

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>> Elo entre escolas e secretarias é importante para garantir coerências nas políticas

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“É preciso exercitar uma escuta ativa, sem imposição, trabalhando em cima de evidências, para que a escola passe a nos ver como parte integrante dela, como um parceiro”

Paulo Bessa, responsável pelo apoio a cinco escolas na região do Baixo Jaguaribe (CE)

“Nosso foco é a aprendizagem. Para que esse diálogo seja produtivo, é necessário ter conhecimento técnico e teórico para contribuir com os gestores escolares”

Marcella Simonetti Pasolini, supervisora escolar no Espírito Santo

“A política de “acountability (prestação de contas) nas escolas não pode se resumir à medição de resultados. É preciso desenvolver a capacidade das pessoas de atingirem aquele resultado. Pressão extrema sem criar essa capacidade resulta apenas em comportamento disfuncional”

Michael Fullan,  especialista em gestão escolar  Foto: Divulgação

Veja a fala dos supervisores e diretores citados neste boletim, no seminário de Gestão Educacional do Ensino Médio, em Minas Gerais

Fotos: Leo Lara

Edimara Galon, diretora da escola David Hold (ES), e a supervisora Marcella Pasolini (ao fundo), em palestra no Seminário de Gestão Educacional do Ensino Médio, em Minas Gerais.

>> Antes vistos como meros fiscalizadores, hoje são parceiros na gestão pedagógica

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Nº 55 - set.2019

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“Hoje, [o supervisor] é um profissional que chega para ajudar na questão pedagógica, para melhorar a relação com famílias, alunos e professores. Acho que avançou muito”

Albert Einstein Freitas,  diretor da Escola Estadual de Educação Profissional Avelino Magalhães, em Tabuleiro do Norte (CE)

 

“Hoje sou a profissional que sou graças ao apoio de minhas supervisoras pedagtógicas. Nunca as vi como uma pessoa que vinha me fiscalizar, mas como uma profissional que vinha me dar um norte”

Edimara Gireli Galon, diretora de escola em São Roque do Canaã (ES)

Aprendizagem em Foco é uma publicação quinzenal produzida pelo Instituto Unibanco.

Tem como objetivo adensar as discussões sobre o contexto educacional brasileiro, a partir de pesquisas, estudos e experiências nacionais e internacionais.

 

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