Início » Boletim Aprendizagem em foco » Lições da pandemia, três anos depois
Edição 87 | março de 2023
Em março, completamos três anos do fechamento presencial das escolas por causa da pandemia de Covid-19. Reabertas parcialmente em 2021 e plenamente a partir de 2022, muitas lições foram aprendidas. Das práticas e mudanças instauradas emergencialmente, o que permaneceu? O que voltou a ser como era? Que transformações no campo educacional a pandemia acelerou ou antecipou?
O recém-lançado Informe Liderança Escolar no contexto da pandemia de Covid-19 – Aprendizagens, desafios e propostas de políticas, produzido pela Universidad Diego Portales (Chile) em parceria com o Instituto Unibanco, inspira justamente essa reflexão sobre que educação é essa que emergiu desse período crítico e sobre o papel das lideranças escolares. “É particularmente interessante conhecer formas de liderar e pensar a escola que tenham emergido diante desse contexto excepcional para que possamos identificar aprendizados que tem o potencial de contribuir para o avanço educacional para além do momento de crise”, destaca a publicação.
Uma das aprendizagens destacadas no Informe relaciona-se à organização da aprendizagem e à necessidade de inovar em sala de aula, uma demanda já existente antes da pandemia. A liderança escolar cumpriu papel importante nesse sentido, “por exemplo, questionando as formas didáticas tradicionais e estimulando os professores a transformar suas matérias pedagógicas”.
Conecta-se a essa outra lição relevante do período: o uso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) na educação. Sem desconsiderar a desigualdade de acesso a esses recursos por parte dos alunos e seus impactos na aprendizagem, bem como a disparidade na disponibilidade de equipamentos e de banda larga existente nas escolas, a publicação chama a atenção para essa “nova forma de pedagogia que os professores tiveram de incluir em seu trabalho diário e profissional” em função da oferta de ensino remoto.
Para o diretor Lucas Coelho, do Colégio Estadual Padre Pelágio, localizado em Trindade (GO), o saldo nesse aspecto foi positivo: “No final das contas, a grande maioria saiu com esse aprendizado na área tecnológica, aprendeu a gravar um vídeo, fazer uma montagem. A gente sempre usa as redes sociais, as tecnologias, Datashow, aplicativos de celular e a escola tem um laboratório móvel de informática também. No pós pandemia a gente não abandonou isso, vamos intensificar”, afirma.
Os líderes escolares desempenham aí papel relevante, assegurando a oferta de ações formativas e o acompanhamento pedagógico do corpo docente para que o uso dessas tecnologias efetivamente potencialize a aprendizagem dos estudantes. O gestor goiano ressalta como o trabalho colaborativo foi importante nesse esforço de formar os docentes para utilização dessas ferramentas.
“Liderar a distância é muito difícil. Os professores tinham uma resistência às aulas remotas, porque tinham dificuldades, não tinham habilidade. As nossas reuniões através do Google Meet também eram formações. A gente pesquisa-va, via coisas diferentes. Os próprios professores que tinham mais facilidade compartilhavam coisas, ajudavam, os coordenadores pedagógicos contribuí-ram muito também. Foi uma liderança compartilhada”, conclui.
Também são destacados no relatório os benefícios do uso dessas novas estratégias e ferramentas para “melhorar a comunicação e o diálogo com as famílias e usar o tempo de maneira mais efetiva”.
Na E.E. Princesa Isabel, de Caratinga (MG), a diretora Elaine Vieira desta-ca o uso intenso que fazem das redes sociais da escola, que conta com uma página no Facebook e um perfil no Instagram, esse último criado durante a pandemia. “Comunicávamos o calendário de entrega dos kits merendas pelo Instagram e muitos acompanhavam por lá, comentavam. Vimos que era um mecanismo forte de comunicação”, relata.
Elaine Vieira, diretora da E.E. Princesa Isabel, de Caratinga (MG)
No pós-pandemia, o acolhimento socioemocional também despontou como outra atribuição imprescindível na escola. “O cuidar-se e o cuidar dos outros foi resgatado em todo o mundo como uma das principais aprendizagens da pandemia, sendo os gestores e os professores um fator de proteção para meninos, meninas e jovens em contexto de crise”, salienta o Informe.
“Tivemos vezes em que em um mesmo dia registramos três casos de alunos que achávamos que estavam com problema cardíaco, que não conseguiam respirar, suavam frio, e quando a gente ia investigar, era nada mais do que ansiedade. Então, esse acolhimento da escola em todos os aspectos, desde o portão, até a sala de aula, um recreio diferenciado, esse contato mais próximo mesmo de todos os servidores passou a acontecer porque o aluno se sente mais frágil, mais vulnerável depois da pandemia”, avalia o diretor do colégio de Trindade.
Uma das ações bem sucedidas criadas por lá no ano passado com esse foco (e já inseridas no plano de ação deste ano) foi a criação de grupos de alunos acompanhados sempre por um coordenador pedagógico que se reuniam durante o recreio uma vez por semana para troca de experiências e conversas motivacionais. Foi construído um espaço especialmente para esses encontros: uma praça dentro das instalações do colégio.
A escola também tem parcerias com serviços públicos de saúde e direciona os casos mais graves para atendimento especializado ou para o núcleo de assistência social vizinho à unidade. “Sempre buscamos parcerias porque a gente sabe que são assuntos que requerem a presença de um profissional”.
Na E.E. Princesa Isabel, a intensidade do problema foi a mesma. “A questão da acolhida dos alunos e dos funcionários não foi simples. Foi algo que a gente foi experimentando. Tiveram dias em que encontrávamos alunos com crise de ansiedade no banheiro, no refeitório, pelo pátio, por todos os espaços. A equipe entendeu logo de cara que não adiantava chegar tentando encher os meninos de conteúdos curriculares sem esse preparo e um planejamento. Vimos que era preciso fazer algo mais acolhedor, motivador e menos engessado no sentido de passar conteúdo, explicar matéria”, lembra a diretora.
“Ainda temos muitos reflexos disso, muitos adolescentes com crise de ansiedade. Procuramos apoio na rede, nas unidades de saúde para que viessem pessoas preparadas para falar sobre saúde emocional. Colocamos isso também na sala de aula com alguns profissionais que a gente percebe um perfil mais acolhedor. Eu acredito muito que esse olhar atento foi fundamental e é ainda necessário”, explica.
Enfim, são muitas as lições para a gestão escolar trazidas pela crise deflagrada pela Covid-19. Frente ao desafio de mitigar o enorme impacto da interrupção das atividades escolares presenciais sobre as aprendizagens, oportunizar os aprendizados do período pode ser uma das estratégias para auxiliá-los nessa empreitada e acelerar o ritmo de melhoria da educação pública. A pandemia reforçou a importância do suporte e acompanhamento das Secretarias para orientar e apoiar as escolas em momentos de crise e de incertezas, bem como a necessidade urgente de políticas de fortalecimento das lideranças escolares.
Informe Liderança Escolar no contexto da pandemia de Covid-19 - Aprendizagens, desafios e propostas
de políticas, Universidad Diego Portales/ Instituto Unibanco
(fev/2023)
Direção para novos tempos e espaços escolares, Comunidade
Educativa Cedac/Fundação Santillana
(mai/2022)
Aprendizagem em Foco é uma publicação quinzenal produzida pelo Instituto Unibanco.
Tem como objetivo adensar as discussões sobre o contexto educacional brasileiro, a partir de pesquisas, estudos e experiências nacionais e internacionais.
Para fazer algum comentário, envie um e-mail para: instituto.unibanco@institutounibanco.org.br
Produção editorial: Redação Fabiana Hiromi; Edição Antônio Gois
Projeto gráfico e diagramação Estúdio Kanno; Edição de arte Fernanda Aoki
A associação brasileira de Pesquisadores/as Negros – ABPN – é uma associação civil sem fins lucrativos, filantrópica, assistência, cultural, científica, e independente, tendo por finalidade o ensino, pesquisa e extensão acadêmico – científica sobre temas de interesse das populações negras do Brasil. No âmbito dessa associação foi idealizado o projeto Afrocientista. A proposta faz parte do conjunto de parceiros fomentados pelo Instituto Unibanco desde 2019.
Projeto Afrocientista
O objetivo do Afrocientista é despertar a vocação científica e incentivar talentos entre estudantes negros e negras matriculados em escolas de ensino médio, mediante sua participação em atividades de pesquisa científica ou tecnológica desenvolvidas pelos Núcleos de Estudos Afro-brasileiro – NEAB e entidades correlatas.
Além de garantirmos o despertar a vocação científica e incentivar talentos entre estudantes negros e negras matriculados em escolas de ensino médio, mediante sua participação em atividades de pesquisa científica ou tecnológica desenvolvidas pelos Núcleos de Estudos Afro-brasileiro. Agora temos o desafio de operacionalizar um projeto de tamanha relevância e complexidade num contexto de pandemia e em formato virtual.
– São 12 NEABs e seus respectivos coordenadores e coordenadoras;
– 12 bolsistas da graduação que apoiam os coordenadores dos núcleos;
– 17 escolas (08 antigas e 9 novas);
– 116 bolsistas da educação básica;