Seminário sobre equidade racial e gestão escolar discute caminhos e práticas para redução de diferenças entre o aprendizado de estudantes goianos
Painéis, vivências e atividade culturais compuseram a programação do evento, que, partindo do recorte racial, discutiu também questões de gênero
Reconhecer a desigualdade racial da sociedade, espelhada na escola, buscar um letramento e tomar consciência dessa situação e agir em prol da equidade são três passos essenciais para serem incorporados pelo sistema educacional brasileiro. Assim defendeu Ricardo Henriques, superintendente-executivo do Instituto Unibanco na abertura do “II Seminário de Equidade Racial na Gestão Escolar: Avanços, Desafios e Novas Perspectivas”.
Ricardo Henriques, superintendente-executivo do Instituto Unibanco.
O encontro, promovido em 2 e 3 de dezembro pela Secretaria de Estado da Educação (Seduc) de Goiás e pelo Instituto Unibanco, foi direcionado a1,2 mil profissionais da rede, entre gestores escolares, técnicos das Coordenações Regionais de Educação e do órgão central da secretaria. Fátima Gavioli, Secretária de Educação do estado, também presente na abertura do evento, ressaltou a importância desses profissionais como multiplicadores dos aprendizados e das discussões realizadas. “São vocês quem levam para as escolas e plantam nas comunidades conhecimentos que mudam as vidas das pessoas”, comentou.
Fátima Gavioli, Secretária de Educação do estado
A programação seguiu composta por quatro painéis. O primeiro buscou discutir os desafios da implementação de uma política de equidade racial nas escolas públicas goianas com Iêda Leal, representante do Movimento Negro Unificado, e Zara Figueiredo, secretária de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão do MEC.
As palestrantes levantaram questões como pertencimento e práticas para uma efetiva inclusão. “Temos necessidade de um pacto antirracista construindo por educadores e estudantes”, afirmou Iêda. “O pertencimento racial e social não pode determinar a trajetória do estudante”, completou Zara.
O segundo painel expandiu o debate sobre equidade para questões de gênero e identidade étnico-racial. O terceiro painel trouxe práticas exitosas no campo da equidade racial, com representantes da Seduc, do Instituto Unibanco e do Fórum Goiano de Mulheres e Grupo de Mulheres Negras Kalunga. Por fim, o papel das comunidades escolares na busca por equidade foi discutido por Jane Reolo, especialista em políticas públicas do Instituto Unibanco, e José Joaquim Gomes Neto, coordenador de Acompanhamento das Escolas de Tempo integral da Seduc-GO.
“Precisamos promover a pluralidade, que é a convivência e o conhecimento dessa diversidade”, ressaltou Jane. “Equidade diz respeito ao pouco mais que você tem de dar a uma pessoa para ela chegar ao mesmo lugar que outra chegaria sozinha. Diz respeito a agir de forma diferente, a sair do senso comum”, declarou Neto.
A programação incluiu ainda momentos de vivências, que trataram do combate ao racismo e à violência de gênero e da educação em quilombos e terras indígenas, além de uma apresentação cultural.
O papel do gestor
O evento teve como objetivo fortalecer a criação e implementação da Política Estadual de Promoção da Gestão Escolar para Equidade Étnico-Racial na rede estadual de Educação de Goiás, incentivando práticas que garantam uma educação mais justa e inclusiva. O papel do gestor é essencial no combate a violências de raça, de gênero ou motivadas por outro tipo de discriminação no ambiente escolar.
A iniciativa está alinhada à Lei nº 10.639, sancionada em janeiro de 2003, que incluiu a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira. Para isso, é essencial o fortalecimento da Educação para as Relações Étnico-Raciais (ERER), na formação continuada de professores e na implementação da transdisciplinares da abordagem curricular dos temas raciais.
O combate à desigualdade racial nas escolas pública de Goiás, segundo Henriques, deve ser seguido pela difusão dessa prática no combate de outros comportamentos preconceituosos, como abordado no evento. A expectativa é que o exemplo de Goiás se multiplique em outras redes do país.
A identificação de onde ocorrem as desigualdades deve estar incorporada à prática dos gestores comprometidos com garantia do direito à educação e a equidade . Por exemplo, é notório e verificado em dados que são os alunos pretos e pardos que possuem maior índice de evasão e repetência. Além de assegurar a frequência desses estudantes, Henriques ressaltou que é preciso verificar a aprendizagem, em cada etapa do processo e em cada matéria, para assim conseguir agir de forma específica. Nesse sentido, são de grande auxílio ferramentas de gestão da aprendizagem, como o Circuito de Gestão, metodologia do programa Jovem de Futuro.
Luta histórica
A história da luta racial no estado também estava presente no seminário. Chamava atenção do público o cenário que homenageava 11 personalidades goianas atuantes em movimentos étnico-raciais:
Eram elas:
- Chica Machado, ex-escravizada, influente na região de Niquelândia por volta de 1750;
- Dona Procópia dos Santos Rosa (Iaiá Procópia), líder quilombola e guardiã da cultura Kalunga, em Monte Alegre de Goiás (GO);
- Dorvalino Augusto da Silva Tapuia, cacique da aldeia Tapuia, em Rubiataba (GO);
- Eunice Tapuia, liderança indígena e professora da Universidade Federal de Goiás (UFG);
- Iêda Leal, pedagoga e militante do movimento negro;
- João Martins Alves (Pai João de Abuque), líder quilombola e precursor do candomblé no estado;
- José do Patrocínio Marques Tocantins, jornalista e abolicionista goiano do século XIX;
- Leodegária Brazília de Jesus, escritora e educadora nascida em Caldas Novas (GO);
- Maria Elisângela Antunes Pereira, militante dos direitos humanos e coordenadora da Igualdade Racial em Abadia de Goiás;
- Raul Hawakati Mauri, líder indígena da etnia Karajá;
- Vilmar Kalunga, líder quilombola da comunidade Kalunga.
Goiás abriga o Território Quilombola Kalunga (TQK), espalhado pelos municípios de Cavalcante, Teresina de Goiás e Monte Alegre de Goiás, na região da Chapada dos Veadeiros. O TQK é reconhecido como Sítio Histórico e Patrimônio Cultural e é habitado há mais de 300 anos. Atualmente, possui 39 comunidades com 7,5 mil quilombolas.