Trabalho contínuo e interdisciplinar sobre equidade racial é resultado de iniciativa implementada pela Seduc-CE em parceria com o Instituto Unibanco
Para Alessandro Alencar de Moura, superintendente da regional de Brejo Santo, escolas contam agora com ações espalhas pelo ano todo, interdisciplinares e mais aprofundadas sobre cultura africana, afro-brasileira e indígena
Maior aprofundamento das discussões raciais no cotidiano da aprendizagem. Para o professor Alessandro Alencar de Moura, superintendente regional da Coordenadoria Regional de Desenvolvimento da Educação (Crede) de Brejo Santo, no Ceará, esse é um dos principais resultados da implementação, a partir do final de 2022, do Sistema de Gestão para a Equidade Racial, fruto de parceria entre a Secretaria da Educação do Estado do Ceará (Seduc-CE) e o Instituto Unibanco, e também da decisão da Seduc-CE de fazer da temática racial o foco das ações educacionais de 2023.
Segundo o superintendente, responsável por cinco escolas na Crede 20, em 2023 as mudanças decorrentes da iniciativa são visíveis, pois as ações começaram junto com o ano letivo, integrando o planejamento da Seduc-CE, das Credes e das escolas.
“Nós percebemos que as escolas pontuaram ações [raciais] no decorrer do ano, não somente nos primeiros três meses ou em pontos distantes um do outro”, conta. “Elas fizeram um calendário, de modo a ter esses momentos durante todo o ano, de maneira organizada e de forma a evitar superficialidade”, explica.
Na sua Crede, ele destaca ter tido a preocupação de trabalhar para que as escolas fugissem do folclórico, dos desfiles ou trajes típicos, como é comum acontecer no Dia dos Povos Indígenas ou no Dia da Consciência Negra: “Essas datas não deixam de ser importantes, mas se forem só ações superficiais, não fazem com que os alunos se reconheçam como afrodescedentes, não fazem com que eles conheçam realmente a cultura de onde vieram, não fazem com que tenham orgulho da cor, da raça, da sua origem cultural”.
Entre as ações implementadas, Alessandro destaca o trabalho de uma professora que decidiu criar atividades que comparam os dados gerados pela pesquisa sobre a autopercepção racial dos estudantes com dados do IBGE. A ideia, entre outros pontos, é questionar como a escola está em relação aos dados gerais do Brasil. O trabalho vai incluir, além de Língua Portuguesa, que é a disciplina da professora, História e de Geografia. Em outro caso, uma professora de biologia vai aproveitar a disciplina “Ervas medicinais” para trabalhar os conhecimentos afrodescendentes e indígenas, ligando um conhecimento ao outro e conectando Biologia, Geografia e História.
Sensibilização e transformações
Alessandro explica que o trabalho inicial de equidade racial passa muito pela autopercepção dos estudantes: “Boa parte dos alunos não se reconhecem como negros e indígenas e não sabem que estão inseridos dentro desse prejuízo histórico milenar que persiste até hoje.”
Alessandro acredita que a ampliação das discussões raciais modifica as estruturas não somente entre os estudantes, mas entre os próprios profissionais da educação. Como exemplo, ele recorda que, na reunião inicial voltada à implementação do Sistema de Gestão para a Equidade Racial, havia pouquíssimos profissionais negros. “Além de mim, homem negro, só estavam a formadora, mulher negra, outro profissional da Seduc-CE e, se não me engano, um outro senhor negro. Qual a porcentagem de pessoas negras, 5%, 10%? Sabemos que 56% dos brasileiros são afrodescendentes no Brasil”, questiona.
“Por isso, qualquer iniciativa que venha falar do povo negro não é exagero, é necessidade”, conclui.
Ele usa sua própria experiência para exemplificar o quanto a educação pode ser transformadora na vida de uma pessoa afrodescendente. Isso porque sua relação maior com a educação para as relações étnico-raciais (ERER) ganhou força quando começou a estudar a questão artística da língua, “principalmente literatura e autores brasileiros com uma linguagem mais aproximada lá da nossa mãe África, como Jorge Amado, por exemplo, que também é nordestino, e tantos outros”. Na sua opinião, o estudo de autores negros ajuda a despertar o interesse dos estudantes em conhecer suas origens e sua própria história.