Para Marcio de Carvalho, diretor de escola em Eusébio (CE), trabalhar a equidade constantemente diminui bullying na escola e facilita resoluções em situações de conflitos

Tendo atuado como coordenador desde 2013 e a partir de 2017 como gestor escolar, o educador Marcio Rogério Gurgel de Carvalho viveu de perto as grandes transformações pelas quais passou a Escola de Ensino Médio em Tempo Integral (EEMTI) Manuel Ferreira da Silva, no município de Eusébio, município da região metropolitana de Fortaleza (CE). Destaca-se entre essas mudanças um trabalho de longa data voltado para promoção da equidade racial, que ganhou desde o ano passado o reforço do Sistema de Gestão para a Equidade Racial. A iniciativa, desenvolvida pelo Instituto Unibanco, foi implementada na rede estadual no âmbito do programa Jovem de Futuro.

Imagem de divulgação de ação antibullying realizada na escola Manuel Ferreira da Silva

Segundo o diretor, o trabalho com as questões raciais ganhou força a partir de 2017, quando a escola começou a implementar o modelo de disciplinas eletivas, já seguindo o formato da reforma do Ensino Médio. Isso possibilitou à escola sair do modelo de disciplinas fechadas, utilizando os conteúdos eletivos para oferecer temas com que os estudantes se identificam. “‘Gênero e Diversidade’ é eletiva desde o primeiro ano de implementação; também ‘Memória e Cultura Afro-Brasileira’ a gente já ofereceu várias vezes, especialmente para podermos debater essa temática”, explica.

Dentro desse processo, a escola implementou o projeto “Escola, Espaço de Reflexão”, que trata majoritariamente de questões étnico-raciais. A iniciativa é baseada em discussões temáticas promovidas durante aulas, encontros e oficinas, e, neste ano, a proposta da escola é trabalhar na disciplina de Formação para a Cidadania. O projeto oferece aos estudantes a possibilidade de escolher entre diversos temas de estudo e tem como “culminância” a apresentação dos resultados e troca de experiências.

“Os temas deste ano nós ainda não fechamos com os professores”, diz Márcio, “porque a gente traz as sugestões, como ‘Percepção da cosmologia das religiões de matriz africana’, ‘Tolerância na escola’, ‘Relações étnico-raciais no Ceará’ e ‘Racismo religioso na escola’, e os professores que decidem”.

Sistema de Gestão para a Equidade Racial

O Sistema de Gestão para a Equidade Racial, iniciativa implementada pelo Ceará em conjunto com o Instituto Unibanco, é um projeto que permite às escolas realizarem uma autoavaliação sobre como está o nível de suas ações pela equidade racial, ao mesmo tempo que são orientadas sobre possíveis atividades que podem realizar para melhorar sua atuação na área.

Implementado inicialmente no Espírito Santo, o projeto chegou ao Ceará em 2022 e já está presente em seis das 22 Coordenadorias Regionais de Desenvolvimento da Educação do estado, totalizando 203 escolas. No caso da EEMTI Manuel Ferreira da Silva, onde Marcio é diretor, o projeto ajudou bastante no processo de tornar a equidade racial uma discussão transversal entre todas as disciplinas: “Ele veio reforçar o que a gente já vinha trabalhando. Hoje, quase tudo que fazemos perpassa o filtro do debate racial, do debate da equidade. Ao refletir sobre essas questões, tentamos perceber algo que está fora do nosso olhar, o que precisa incluir”, explica.

Para Marcio de Carvalho, ações contra bullying e racismo devem acontecer de forma contínua nas escolas

Os resultados, segundo o diretor, acontecem no dia a dia dos estudantes. “Quando eu me identifico, quando eu vejo que as minhas questões são trabalhadas na escola, que eu sou respeitado, que sou visto, que eu me faço perceber nesse espaço, eu quero estar aqui. Esse é o meu lugar, é onde eu acho que sou acolhido e tenho as minhas questões trabalhadas e respeitadas. Então, acho que tem um resultado interessante de todas as ações que temos feito”.

Combate ao racismo

Para o diretor, a questão do bullying, inclusive no que tange a questões raciais, precisa ser trabalhada de maneira contínua para dar resultados. Ele conta que, no ano passado, houve uma situação em que um estudante fez um comentário discriminatório sobre o cabelo de uma colega do primeiro ano do Ensino Médio.

Para resolver a situação, entre outras ações, a escola adiantou o projeto relacionado ao bullying, que era realizado em outra época do ano. O professor trabalhou, promoveu uma reflexão sobre os temas com os estudantes e uma peça de teatro foi encenada pelos estudantes ao final. Paralelamente a isso, na disciplina de Formação para a Cidadania, houve ações de escuta ativa, para saber o que aconteceu, quem estava diretamente envolvido, além de chamar os alunos e suas famílias para conversar sobre o episódio.

Desde então, não houve situação parecida na escola, mas o gestor destaca que o olhar atento se mantém. “Acontece de aparecer alguma situação, e a gente está sempre ali, acompanhando os processos, tomando ações pedagógicas para a gente trabalhar com os meninos”, explica. “Raça, etnia, questão de crenças religiosas são discussões que a gente precisa trazer o tempo todo para a escola porque o ambiente é diversificado, heterogêneo. São várias matrizes, e a escola precisa acolher todas elas”, completa.