Ações durante e pós pandemia são necessárias para evitar evasão
O provável aumento de índices de evasão escolar tem sido apontado por especialistas como uma das principais consequências desse período prolongado de paralisação das atividades presenciais. Embora as redes de ensino venham buscando, por meio da oferta de atividades de ensino remoto, reduzir os prejuízos na aprendizagem de seus estudantes, o desafio de mantê-los engajados nos estudos é grande.
Além da autonomia e disciplina exigidas dos alunos nessa reorganização da vida escolar, a falta de acesso ou o acesso limitado à internet configura-se como um primeiro obstáculo para que a totalidade dos estudantes seja contemplada.
Diante desse cenário, especialistas e organizações têm reforçado a importância dos gestores educacionais e escolares desenvolverem ações específicas com foco nos alunos com maior risco de evasão durante esse período.
Uma recomendação em comum entre as elaboradas por organismos internacionais como a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Unesco e Banco Mundial é a ênfase em estratégias para acompanhar e estimular o engajamento dos estudantes. A OCDE, por exemplo, destaca: “As escolas devem desenvolver um sistema de comunicação e uma forma de checagem diária com cada aluno.”
A Organizing Engajement, uma publicação on-line especializada em conteúdos sobre educação, engajamento e equidade, elaborou um material para contribuir com o debate sobre estratégias educacionais durante a pandemia de Covid-19. Algumas das dicas presentes são o recolhimento de feedbacks constantes pela escola junto aos estudantes e pais sobre o processo de aprendizagem e as relações educacionais existentes e o estabelecimento de diálogo contínuo por meio de fóruns online, por exemplo, fortalecendo os laços de confiança entre os atores.
Na E.E.M. Ana Costa Teixeira, situada em Itapipoca (CE), a 132 km de Fortaleza, a gestão desenvolveu um sistema de ouvidoria dos alunos por meio de um formulário on-line. “Enviamos semanalmente para entender quais são as angústias dos nossos alunos e como ele está se sentindo nesse processo e como a escola pode melhorar as relações pedagógicas para que ele se sinta contemplado diante das necessidades dele”, conta o diretor Jhonata Paixão Tabosa. Foi, por exemplo, a partir do feedback dos estudantes obtido por meio desse formulário sobre a dificuldade enfrentada por eles para baixar as videoaulas por conta de limitações no acesso a internet que os professores passaram a produzir também podcasts.
Os pais ou responsáveis são apontados como parceiros fundamentais da escola nesse esforço de engajamento dos alunos nas atividades escolares e, por isso, outra recomendação recorrente é a comunicação com as famílias.
O Banco Mundial sugere que os ministérios da Educação dos países forneçam todo o suporte possível às famílias, lançando mão de ferramentas como rádio, tevê e mensagens de SMS para dar dicas e conselhos aos pais sobre como apoiar seus filhos nos estudos.
Na Unidade Escolar Hesíchia de Sousa Brito, localizada na zona rural do município de Piracuruca (PI), a gestão organizou a equipe para realizar um acompanhamento muito próximo dos acessos dos estudantes à plataforma estruturada para as atividades não presenciais. “Nosso objetivo principal é que nossos alunos não venham a se dispersar. Que esse tempo que estão afastados da escola não seja um motivo que venha a gerar um desestímulo e eles venham a evadir”, ressalta o diretor José Idelson de Brito.
Diariamente, a equipe administrativa emite relatórios para a coordenação com a quantidade de acessos à plataforma e as informações sobre os que não estão acessando. Nesse caso, uma outra parte da equipe foi designada para entrar em contato com a família desses estudantes.
“Nós ligamos para os pais para saber o que está acontecendo, quantas horas o filho está no celular estudando, [pedimos] que ele acompanhe, pergunte, observe. O pai nesse exato momento é o segundo elo da escola. Aquele trabalho que o coordenador da escola faz cobrando, que o diretor da escola faz indagando, monitorando, esse trabalho agora nós dividimos a responsabilidade com os pais”, explica o diretor.
Confira o depoimento do diretor José Idelson de Brito, da Unidade Escolar Hesíchia de Sousa Brito, localizada na zona rural do município de Piracuruca (PI)
Pós pandemia
O desenho de um plano bem estruturado do retorno das atividades pós-pandemia também é apontado como essencial para enfrentar o problema da evasão. Como os alunos serão avaliados, como será realizada a recuperação dos que apresentarem defasagem de aprendizagem, como serão repostas as aulas perdidas e como serão acompanhados os estudantes com maior propensão a evadir são alguns dos pontos fundamentais desse plano nesse sentido.
O comitê técnico da Educação do Instituto Rui Barbosa – órgão que congrega os tribunais de contas brasileiros – elaborou uma nota técnica com recomendações aos órgãos de controle do país para durante a crise e após a retomada das aulas presenciais. Nesse segundo bloco, uma das indicações é:
“Promover, em colaboração com entes públicos e outros atores em educação, estratégias de busca ativa das crianças e jovens que podem não retornar à escola depois que as atividades forem retomadas”.
A necessidade de ações específicas direcionadas aos alunos em situação de vulnerabilidade ou cuja família pode ter passado por um processo de pauperização em decorrência da crise gerada pela Covid-19 é outro ponto de atenção. A Human Rights Watch, ONG internacional que atua na defesa dos direitos humanos, também produziu um relatório alertando para os impactos negativos da pandemia sobre as crianças e uma das indicações para o período pós-crise vai nessa linha: oferecer às famílias que sofreram perda de renda apoio financeiro para as despesas relacionadas à escola, como alimentação e transporte, para que esses alunos tenham condições de voltar a estudar.
Por fim, mas não menos importante, a questão do acolhimento dos alunos no retorno às aulas é outro ponto considerado decisivo entre as ações para reduzir a evasão. No CETI Zacarias de Góis, conhecido como Liceu Piauiense, de Teresina (PI), a gestão já está projetando essa retomada das atividades com a participação dos estudantes. “Aos alunos a gente tem que perguntar o que é melhor para eles. Como você gostaria de ser recebido no seu primeiro dia de escola? O trabalho associado da gestão com o grêmio e os professores é um tripé que não vai deixar de funcionar nunca”, acredita a diretora Samara Regina Santiago. “O planejamento do primeiro dia de aula tem que ser pelo aluno e para o aluno. Porque ele se sentindo bem, isso flui de maneira feliz e tranquila dentro da escola”, complementa.
Confira o depoimento da diretora Samara Regina Santiago, do Liceu Piauiense, de Teresina (PI)
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