Lei de Cotas: resultados são positivos, mas ainda há avanços a serem feitos
Em agosto completam-se 10 anos da Lei nº 12.711/2012, conhecida como Lei de Cotas, uma das mais importantes legislações para o ingresso de pessoas negras no ensino superior e que pode contribuir para uma sociedade equitativa e diversa. Ela propõe que metade das vagas nas universidades públicas federais seja para cotistas, englobando estudantes de escolas públicas de baixa renda, pretos, pardos e indígenas.
Em um país onde 56% da população se autodeclara negra e apenas 39% têm ensino superior segundo dados do IBGE divulgados em 2022, é preciso reconhecer que essa é uma conquista das lutas do Movimento Negro, também promovida por marcos históricos como a participação do Brasil na Conferência de Durban em 2001, assim como o pioneirismo da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) em ser a primeira universidade a adotar as cotas raciais, em 2002.
Se olharmos para os cursos mais elitistas, como por exemplo medicina, designer gráfico e publicidade e propaganda, o percentual de estudantes negros não chega a 30%. Isso se reflete também no mercado de trabalho, onde 37,9% dos homens e 33,2% das mulheres negras com diploma de ensino superior trabalham em cargos que não exigem o diploma, segundo dados do Instituto iDados. Diante disso, a criação das cotas raciais foi uma tentativa de reparar historicamente os resquícios do racismo estrutural que ainda são fortemente presentes na sociedade.
Um estudo realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) mostra que a Lei de Cotas estendeu em 39% a presença de estudantes pretos, pardos e indígenas oriundos de escolas públicas em instituições de ensino superior federais no período de 2011 a 2016.
Aprendizados importantes
Quando se olha para os resultados, há vários estudos, como o artigo publicado por Adriano Senkevics e Ursula Melo, que mostram a eficácia da Lei de Cotas. Esses dados apontam para um aumento da participação de ingressantes oriundos do ensino médio público, de 55% para 64% entre 2012 e 2016, sendo que os grupos mais beneficiados foram os autodeclarados pretos, pardos e indígenas.
Outro trabalho que complementa essa tese é um estudo de 2022 coordenado pelo Laboratório de Estudos e Pesquisas em Educação Superior da UFRJ e pela Ação Educativa, o qual comprova o aumento de ingressantes por cotas no ensino superior entre 2010 e 2019, além da diminuição da evasão desse grupo.
Nesses 10 anos da lei, foi possível perceber muitos aprendizados, tendo como principal ponto positivo a elevação da expectativa dos estudantes, do acesso, da permanência e da aprendizagem, do que se conclui que é possível construir uma política eficaz na redução das desigualdades raciais no Brasil.
Pontos de atenção importantes
É preciso também olhar para os desafios que ainda devem ser superados, principalmente na garantia de permanência desses estudantes nas universidades. Segundo reportagem de Bruno Alfano ao jornal O Globo, 30 das 60 universidades federais sofreram cortes no orçamento em 2021 e, agora em 2022, 17 delas correm o risco de interromper suas atividades em novembro. Esse é um problema recorrente que acaba tornando cada vez mais difícil combater a evasão.
Ao final, a educação não consegue resolver sozinha os problemas da desigualdade e do racismo, mas com certeza contribui de maneira importante para isso. Nas universidades, é preciso que existam maiores investimentos no orçamento para garantir a manutenção dos alunos e o funcionamento dos seus cursos, principalmente através da oferta de bolsas de iniciação científica (CNPq e Capes) e de estágios remunerados na própria universidade.
Quanto à sociedade, é preciso não só renovar a Lei de Cotas, mas também ampliar a pauta das ações afirmativas ao longo de todo o ciclo educacional, ou seja, preparar os estudantes desde o início da sua vida escolar. Assim, será possível reconhecer as vulnerabilidades e entender que elas são herdadas dos beneficiários, e em muitos casos agravadas ao longo da vida. Portanto, as ações de combate às vulnerabilidades devem ser um compromisso de todos para todos.
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