Projeto disponibiliza banco de práticas reunidas por meio dos editais Gestão Escolar para a Equidade – Juventude Negra e inclui formações e sistema de autoavaliação que ajuda escolas a melhorarem seu trabalho contra a desigualdade racial

 Um projeto do Instituto Unibanco, realizado em conjunto com as secretarias estaduais de Educação do Espírito Santo e Ceará, vem ajudando escolas de ambas as redes (que também são parceiras no programa Jovem de Futuro) a implementar de forma institucional, transdisciplinar e sistemática a Lei 10.639/2003, que estabelece a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira e africana. Entre seus principais destaques, a iniciativa leva às escolas um mecanismo de autoavaliação em relação ao cumprimento da Lei 10.639, por meio do qual a escola identifica suas principais potencialidades e fragilidades, e apresenta uma série de orientações e sugestões de ações que podem ser realizadas a partir desse diagnóstico.

As ações são esmiuçadas no “Caderno da Gestão Escolar para Equidade”, criado especificamente para o projeto e disponível para as escolas onde ele está sendo implementado. Na publicação, estão informações sobre os marcos históricos e legais das lutas raciais no Brasil, bem como sobre o papel da gestão escolar na questão das relações étnico-raciais. Além disso, estão descritas 39 práticas pedagógicas transversais que podem ser aplicadas nas escolas a partir do momento em que a escola realiza sua autoavaliação.

Implementado de forma piloto nas 14 escolas da regional de São Mateus, no Espírito Santo, em 2021, o projeto colheu excelentes resultados e, por decisão da Secretaria de Estado da Educação do Espírito Santo (SEDU-ES), foi expandido em 2022 para todas as regionais de ensino, já estando presente em mais 65 escolas. No Ceará, o projeto começou neste ano e já está presente em seis das 22 regionais do estado, totalizando 203 escolas.

Como explica Marilucia do Espírito Santo, analista de Gestão Pedagógica do Instituto Unibanco, o tema da equidade racial se consolidou na organização a partir das duas edições do Edital Gestão Escolar para a Equidade – Juventude Negra, realizadas em 2015 e 2017 em parceria com o Baobá-Fundo para a Equidade Racial e o Núcleo de Estudos Afro-brasileiros da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR). O edital selecionou e premiou vivências e iniciativas de equidade racial realizadas em escolas de todo o país.

“Os editais buscavam trazer para a gestão escolar um foco para a implementação da Lei 10.639/2003”, lembra Marilucia, destacando que o movimento negro sempre pautou que a escola era campo estratégico de atuação. Por isso, ela explica, tanto nos editais como nas ações atuais, “a ideia é institucionalizar a aplicação da lei. Atualmente, o que vemos nas escolas são professores negros que implementam ou professores indígenas. A ideia é fortalecer esse marco e também a gestão escolar”.

Com o conjunto de práticas levantadas pelos editais em mãos, o Instituto contou com a consultoria da pesquisadora Jaqueline Lima Santos, doutora em Antropologia, que fez a análise e o aprimoramento das práticas selecionadas, conectando cada uma aos eixos e diretrizes do “Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Etnicorraciais e para o Ensino de História e Cultura Afrobrasileira e Africana”, marco legal de 2008 que estabeleceu de que forma deve ser implementada a Lei 10.639.

A partir desse contexto, Jaqueline desenvolveu uma planilha de autoavaliação por parte das escolas. A avaliação se dá por meio de um questionário cujas perguntas buscam identificar se a escola cumpre requisitos importantes para implementação da Lei 10.639, como possuir material didático de qualidade e atualizado sobre a questão racial, realizar reuniões sistemáticas para dar subsídios sobre equidade racial à equipe pedagógica e possuir práticas de equidade racial como parte de seu plano pedagógico. Com base nesse documento e em conjunto com as ações de equidade já existentes nos estados, foram elaborados os sistemas que estão sendo implementados no Ceará e Espírito Santo.

Como funciona o projeto

A implementação do projeto leva cerca de um ano. O primeiro período, de cerca de três meses, é tomado pelas definições realizadas em conjunto pela secretaria local e pelo Instituto, especificando questões como a quantidade de regionais e escolas que farão parte do projeto e quais serão priorizadas. Para isso, as redes usam como critérios dados sobre evasão e desempenho escolar, sempre considerando a questão de raça, ou critérios mais abertos como uma consulta sobre as regionais que querem participar.

Em seguida, há um mês de formações, pautadas em sensibilização e letramento racial, das quais participam os profissionais das regionais, depois os diretores, coordenadores pedagógicos e professores das escolas. A autoavaliação pelas escolas é realizada na sequência e a orientação é que ela seja feita de forma democrática, envolvendo a comunidade.

Por fim, a escola elabora um plano de ação, no qual define uma ou mais práticas para implementar. Para isso, o próprio sistema de avaliação indica as ações que serão boas para sanar as áreas em que a unidade demonstrou maior fragilidade. Após a execução do plano, é prevista uma etapa de monitoramento, que serve para avaliação de tudo que foi efetivado.

Da sensibilização à responsabilização

De acordo com Fabíola Nascimento Camilo, analista de Inovação em Políticas Educacionais do Instituto, embora o racismo não seja um tema fácil de tratar, a recepção das formações foi positiva:

“Os profissionais tiveram abertura, contaram experiências da escola, do cotidiano. Nós temos que entender esse movimento de sensibilização, de responsabilização, de aprofundamento e de atuação. É isso que que compõe o processo desses profissionais trabalharem com a temática étnico-racial nas escolas”.

Sobre o trabalho de sensibilização, Marcella Escobar, analista do Instituto que atua na implementação do Jovem de Futuro no Ceará, destacou a necessidade de apresentar a história do movimento negro, os marcos legais e, principalmente, a perspectiva da Lei 10.639 como fruto de um movimento de décadas, lembrando que esse é o começo de um longo aprendizado:

“A expectativa é que as escolas saiam da formação com esse repertório básico sobre o tema”.

Para Luanna Meriguete Santos, analista de implementação de programas e projetos educacionais do Instituto que atua no Espírito Santo, o projeto oferece uma perspectiva concreta do que cada escola pode fazer para reduzir a desigualdade racial em seu trabalho.

“Ele entra com um repertório de ações e também com a formação em si, ampliando conhecimento, repertório e a responsabilização da equipe escolar sobre essa temática, além de trazer visibilidade para a pauta”, afirma.

Sinergia com o Jovem de Futuro

Outra vantagem é que o projeto está presente atualmente nos estados onde já existe o Jovem de Futuro, programa do Instituto Unibanco que busca melhorar a educação por meio da gestão escolar, de maneira totalmente integrada com o programa.

“A estratégia está muito conectada com o centro do nosso trabalho, que é o Circuito de Gestão. Assim, ela fortalece nosso trabalho, no diagnóstico da escola, na importância de considerar a escuta do professor, da comunidade”, explica Luanna.

A iniciativa também ajuda a garantir uma coerência interna entre secretaria, regionais e escolas sobre a questão da equidade, como explica Fabíola, em consonância com o que o Jovem de Futuro preconiza (o alinhamento entre as diferentes instâncias da rede):

“Os secretários de Educação reconhecem a importância, há o desdobramento para as regionais e se chega até as escolas, garantindo a coerência interna da política pública. É uma mudança da cultura escolar”, afirma.

Para Ivanilda Amado Cardoso, analista de articulação e disseminação do conhecimento do Instituto, as experiências do Ceará e Espírito Santo são muito exitosas e podem servir de referência para outros estados do Brasil.

“Podemos trazer mais visibilidade para que outras redes conheçam melhor esse instrumento, essa ferramenta metodológica. Como pesquisadora, considero que é uma ferramenta inovadora, que traz contribuições importantes para o campo da educação”.

Instituto Unibanco e a agenda de equidade

Há alguns anos, a equidade é um tema prioritário para o Instituto Unibanco, estando presente de forma transversal em diversas de suas ações. Além do projeto de gestão escolar para equidade em implementação no Espírito Santo e no Ceará, atualmente desenvolve ou apoia diversas iniciativas com esse enfoque.

É parceiro do projeto Indiques para as Relações Étnico Raciais, realizado pela Ação Educativa, que consiste formação de profissionais da educação do Estado do Maranhão para aplicação de metodologia que auxilia a escola no desenvolvimento e avaliação de ações para implementação da Lei 10.639.

Apoia também o Afrocientista, de iniciativa da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros (ABPN), voltado à iniciação científica de alunos do Ensino Médio público em parceria com Núcleos de Estudos Afro Brasileiros (NEABs) de universidades públicas de diversos estados (AC, AM, AP, DF, GO, MA, MG, PA, PB e TO).

No âmbito da produção de conhecimento sobre o tema, o Instituto desenvolve pesquisa, em parceria com a Universidade de Stanford e Lemann Center, sobre os efeitos da discriminação racial na atribuição de notas, e contribuiu com a elaboração do documento de Educação para Relações Étnico Raciais (ERER) que comporá o Educação Já! Também apoia working paper sobre equidade racial na BNCC e no Novo Ensino Médio em produção pelo Coletivo de Intelectuais Negros e Negras (CDINN); pesquisa qualitativa da Uniperiferias sobre equidade racial em 8 escolas Jovem de Futuro (CE, ES, GO e PI); a revisão dos indicadores de educação inclusiva pelo Instituto Rodrigo Mendes e a Plataforma Equidade Racial da Educação Básica, do CEERT, entre outras.

No campo do fortalecimento institucional, o Instituto investe no fomento de organizações de reconhecida atuação no campo da equidade. É parceiro do GIFE, cuja Rede Temática Equidade Racial desenvolve uma série de ações para a qualificação da atuação de instituições do mundo fundacional nessa área; do Geledés – Instituto da Mulher Negra, que promove o Prêmio Estratégias de Equidade no Enfrentamento à Evasão Escolar: implicações da Covid-19 para a permanência na Educação Básica; do Fundo Baobá (para a equidade racial) e do Fundo Elas (de direitos para mulheres).