A gestão de carreiras na Educação
Carreira é um tema essencial para nossa discussão de gestão estratégica de pessoas. Em primeiro lugar, porque a força de trabalho do setor público no Brasil organiza-se, predominantemente, por meio de carreiras: polícia militar, diplomacia, profissionais da saúde, procuradoria, entre outros exemplos. Da mesma forma, na área da Educação, há diversas funções organizadas em carreiras como, por exemplo, professor(a), agente de apoio escolar, secretário(a) de escola, merendeiro(a), servente etc.
Em segundo lugar, é importante ressaltar que a carreira é o elemento central capaz de estruturar uma série de incentivos profissionais de curto, médio e longo prazo. Nesse sentido, uma carreira bem desenhada tem potencial de – de maneira equilibrada e transparente – alinhar os interesses particulares do(a) profissional aos da Secretaria, ou seja, ser capaz de buscar ao mesmo tempo a satisfação individual e a qualidade do ensino para os(as) estudantes.
Entretanto, pela forma como estão estruturadas hoje muitas das carreiras, elas não contêm os melhores incentivos que os(as) gestores(a) de pessoas gostariam. Diferente disso, elas têm sido muitas vezes reduzidas a tabelas salariais e à discussão de promoção e progressão igualada a uma mudança no padrão de vencimentos. Esse seria o principal ponto de atenção: entender que carreira envolve questões para além do avanço salarial e que existem formas de incentivo não monetário.
A ideia de carreira relaciona-se a muitos fatores, como o desenvolvimento profissional e a possibilidade de assumir novos cargos e responsabilidades. Espera-se que isso gere estímulo e engajamento, apresentando novos desafios e exigindo o exercício de diversas competências, para as quais seja possível se preparar por meio de formação aplicada à resolução de problemas reais do cotidiano do trabalho. Também é fundamental que haja feedback constante de gestores(as) sobre o desempenho no alcance ou não de metas previamente pactuadas. Veja quanta coisa se estrutura em torno da carreira: a gestão por competências, o processo de formação continuada e a própria gestão do desempenho, onde se inclui o uso de ferramentas de avaliação de resultados.
Carreira docente
Nesse sentido, poderíamos pensar que a carreira docente, por exemplo, deveria evoluir não apenas em termos salariais, mas também na complexidade das funções exercidas. É possível que as funções de um(a) professor(a) variem, em termos de complexidade, ao longo de sua carreira? Essa complexidade pode se tornar um fator de estímulo? Funções como tutoria ou coordenação de disciplina poderiam ser parte dessa evolução? Há outras funções que poderiam ser incluídas como uma trilha de desenvolvimento docente?
No Brasil, os cargos de direção, chefia e assessoramento são de livre nomeação e exoneração, conforme o inciso V, artigo 37 da Constituição Federal de 1988 – os chamados cargos em comissão. Nesse sentido, considerando apenas a disposição constitucional, os cargos de diretor de escola poderiam ser destinados a qualquer pessoa, inclusive alguém de fora da administração. Porém, na prática, os estados reservam esses cargos a docentes de suas redes, mas, na grande maioria dos casos, este cargo não integra uma carreira.
Vale mencionar ainda as funções gratificadas ou funções em confiança, que são aquelas atribuídas a profissionais também da carreira docente, porém, assim como diretor(a), não integram a carreira docente e contêm caráter transitório. Alguns exemplos são as gratificações para professor(a) coordenador(a), coordenador(a) de formação continuada, diretor(a) de núcleo de apoio pedagógico à educação especial etc.
Entretanto, existe a possibilidade de transformar estas funções em cargos e integrá-los à carreira docente, tornando-a mais ampla, ou seja, incrementando as responsabilidades que podem ser exercidas pelos membros da carreira com o passar do tempo. Em diversos países e mesmo na iniciativa privada, este modelo de organização dos recursos humanos é conhecido como “carreira em Y”, no qual se institui uma carreira mais genérica em nível de entrada, mas que oferece aos seus membros diferentes ramos de especialização ao longo de suas trajetórias profissionais. Nesse caso, um membro da carreira docente poderia optar, por exemplo, entre se especializar em atividades de natureza pedagógica (ramo pedagógico), como a coordenação de disciplinas, ou exercer funções gerenciais (ramo de gestão), hoje muitas vezes exercidas por meio de funções gratificadas.
Confira o original em inglês aqui.
Caminhos dentro da carreira docente
O que você achou desse exemplo Seria interessante incluir a função de direção como parte da carreira docente? Isso diminuiria muito a rotatividade que temos hoje. Você acredita que essa estabilidade seria positiva ou negativa para a rede?
E no caso da tutoria e da coordenação de disciplinas? Você acredita que seria um bom avanço, em termos de complexidade, dentro da carreira de professor(a)? Não significa que esses(as) professores(as) sairiam de sala de aula, mas eles passariam a dividir sua carga horária, aproveitando a experiência que adquiriram exercendo também outras funções. É importante destacar que além disso, nesse modelo não é preciso que todos(as) sigam o mesmo caminho. Carreiras em Y (ou em trilhas, como no caso de Singapura) são adotadas justamente por oferecer opções de evolução profissional diferentes, dentro de uma mesma trajetória, permitindo que profissionais públicos se concentrem no desenvolvimento das habilidades que desempenham melhor.
Você consegue pensar em outros exemplos de funções que pudessem descrever o que um(a) docente poderia fazer em meio e fim de carreira, além de ministrar aulas? Algo que pudesse extrair dele(a) sua melhor contribuição para a rede e motivá-lo(a) a continuar trabalhando com brilho nos olhos? Mesmo que nem todos os seus(suas) professores(as) tenham hoje essas competências, é possível desenhar estratégias de formação continuada para que possam ir se desenvolvendo e ampliando seu leque de possibilidades de atuação profissional.
Depois de pensar nisso tudo, é possível decidir a amplitude adequada das carreiras. Chamamos de amplitude a distância entre o salário inicial e final do(a) servidor(a). Essa diferença deve ser planejada para que essa parceria continue interessante para os dois lados – o(a) profissional deve sentir que ainda tem a contribuir e continuar estimulado(a) a fazê-lo. E essa relação não necessariamente precisa ser até a aposentadoria. O importante é atrair bons(as) profissionais e buscar mantê-los(as) motivados(as) enquanto estiverem conosco. O desenho de uma carreira interessante e desafiadora pode fazer toda a diferença nisso.